A Iniciativa Urukum busca promover ações que valorizem o etnoconhecimento de povos tradicionais ao mesmo tempo em que contempla a força de suas cosmovisões fazendo com que haja um retorno direto aos envolvidos. E, assim, seguimos nossos caminhos entre a arte, a ciência, a literatura e a visão mítica de nossa participação nesse mundo.
PROJETOS
Saberes tradicionais se desenvolvem em estilos de vida relacionados aos ambientes naturais. Suas visões de mundo, além de garantirem conhecimento extenso e minucioso dos processos naturais, também permitem estabelecer relações com o mundo natural distintas das que prevalecem nas sociedades urbanas. Considerando o atual contexto socioambiental, apresentam-se como necessárias as interconvivências de saberes que permitem a compreensão da economia global, bem como o pensar em diferentes perspectivas que desenham novos olhares para a relação da humanidade com a natureza.
Livro Txai – Terra sem raízes
Txai foi lançado na Comic Con EXperience e tem parte de sua arrecadação destinada à aldeia Kene Mera, do povo Shanenawa, no Acre. Por meio das vendas do livro já foi repassado o montante necessário para o registro da associação da aldeia, bem como foram entregues um notebook para uso da associação e um violão.
Txai (pronuncia-se tchai, como tchau) significa amigo, irmão. É um tratamento usual entre os povos do tronco linguístico pano (yawanawa, huni kuin, shanenawa, shawadawa, jaminawa). No livro acompanhamos a história de um personagem nascido em cidades de árvores, crescido em cidades de concreto e alheio às próprias origens, não por vontade própria. Pai indígena e mãe branca tentaram criá-lo como ser da floresta, mas o destino traçou novos caminhos para a criança. O nome dessa época foi esquecido, assim como as origens em verdes tons. Violência e caos, invasores e metais preciosos, territórios em disputa e silêncio dos governantes causaram a morte do pai indígena; à mãe branca restou a fuga e a distância das memórias manchadas de vermelho. Uma jornada de resgate da ancestralidade!
Sobre o desenvolvimento do livro
Foram ao todo cinco grandes caminhadas identificando as plantas, fotografando, anotando as palavras e percebendo o quanto da cosmovisão Shanenawa influencia o contato com a natureza, fazendo com que ações de cuidado e preservação se manifestem naturalmente como parte de sua cultura.
A cada dia cerca de 30 plantas eram catalogadas. À tarde, nos sentávamos em frente ao computador para descarregar as fotos, passar a limpo todas as anotações e confirmar se as fotos tiradas correspondiam às anotações feitas, nesse processo revíamos todo o material coletado durante o dia. Uma das dificuldades era transcrever o nome correto da planta na língua Shanenawa. Como, por exemplo, a planta utilizada para dor de dente, chamada pelos Shanenawa de Bêsha Nixpu, enquanto pelos Huni Kuin é chamada de Vêsha Nixpu; ou ainda, a planta utilizada para os olhos Nui Tasaya em Shanenawa, e Nui Rimi Tasaya em Huni Kuin. Alguns nomes são muito próximos, outros, entretanto, distanciam-se bastante como a planta utilizada para dormir chamada pelos Shanenawa de Kuma Usha, e pelos Huni Kuin de Usharau, fato que vem confirmar a necessidade desse registro, uma vez que a língua Shanenawa, assim como outras línguas indígenas corre risco de extinção.
O livro cumpre duas perspectivas, uma interna que fala diretamente à comunidade, e outra externa, na medida em que se alia ao desejo da aldeia de abrir seu espaço para receber pessoas interessadas em conhecer a cultura Shanenawa. Com isso, o valor intangível dos saberes ancestrais, essencial para a preservação da diversidade cultural, torna-se mais perceptível para não indígenas. Esse valor intangível, por meio do livro de plantas medicinais permite abordar práticas espirituais, métodos de cura, rituais de passagem, histórias orais e conhecimentos sobre a natureza e o ambiente.
AÇÕES DE VISIBILIDADE
Gravado na aldeia Kene Mera, do povo Shanenawa, no Acre, em 2021. Foi Exibido no Acampamento Terra Livre, em Brasília, em 2021, na programação cultural do encontro e também na Cinemateca de Curitiba, no evento Amazônia passa por aqui, em 2021.
Exposição fotográfica da aldeia Kene Mera, do povo Shanenawa, no Acre, no Festival de Felicidade, Curitiba/PR, em 2021
EDUCAÇÃO AMBIENTAL ORGÂNICA
Os projetos da Iniciativa Urukum inspiraram a criação da Educação Ambiental Orgânica. Desenvolvida por Fabio Gimovski, ela traduz a interdependência entre seres humanos e mundo natural em uma relação proveniente da cosmovisão e presente nas práticas diárias dos povos originários. A Educação Ambiental Orgânica pode ajudar as pessoas a desenvolverem um senso mais profundo de conexão com o mundo natural e apreciar a conexão existente entre todos os seres, além de contribuir para a valorização de saberes ancestrais.
O termo orgânico utilizado para definir a Educação Ambiental veio de seu sentido expresso de algo natural, próprio de organismos vivos. Vivos e em constante comunicação entre seres humanos e não humanos. Mais do que oportunidades, são movimentos necessários para que a aproximação das águas de diferentes saberes flua para o mar da educação. Respeitando a relação de comunidades tradicionais com a natureza, a medicina tradicional, as artes e a espiritualidade.
A Educação Ambiental Orgânica busca, sobretudo, formas de valorizar os saberes ancestrais e, principalmente, integrar o aspecto intangível da natureza em sistemas de educação e pesquisa.